No dia 08 de janeiro, uma comissão com mais de 60 camponeses organizados pela Liga dos Camponeses Pobres do Nordeste (L) se deslocou da zona rural do município de Jaqueira-PE para a capital do estado, Recife-PE, com objetivo de intervir em três audiências convocadas as pressas pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE), através do Promotor Agrário Leonardo Caribé. Tais audiências, que tinham como objetivo discutir as questões relativas ao conflito que ocorre nas terras da antiga Usina Frei Caneca e suas implicações, na prática serviu de espaço para que a Empresa Latifundiária Agropecuária Mata Sul S/A apresentasse sua proposta para expulsar os camponeses de suas terras. 3j6g5g
Desrespeitando toda mobilização camponesa, o Ministério Pública de Pernambuco (MP-PE) agiu de forma autoritária proibindo que cerca de 40 camponeses assistissem a “maratona de audiências” para decidir sobre suas vidas. Isso não diminuiu o ânimo, e um ato combativo manteve-se do lado de fora durante todo período que durou as audiências anti-democráticas. Os camponeses organizaram ato combativo com faixa, que diziam: Contra o latifúndio e a pistolagem: Rebelar-se é justo! Bandeiras vermelhas da L e muitos fogos. Cantando os hinos Conquistar a Terra e O Risco, demonstrando que independente destas enroladas do latifúndio em conluio com o velho Estado, a luta combativa seguirá firme e forte.
Dentro da sala das audiências, estiveram presentes além da L, outras organizações em defesa dos camponeses: Associação Brasileira dos Advogados do Povo Gabriel Pimenta (ABRAPO), Comissão Pastoral da Terra (T), Federação dos Trabalhadores Rurais e Agricultores Familiares de Pernambuco (FETAPE), Sindicato dos Agricultores Familiares de Jaqueira (SINTRAF) e a Central Sindical e Popular CSP/CONLUTAS.
A “maratona de audiências” foi organizada para conciliar em três assuntos distintos, mas que ao fundo se resumem a mesma coisa, a luta pelas terras da falida usina Frei Caneca. A empresa latifundiária, que mantém contratos fraudulentos de arrendamento sobre estas terras e ainda quer expulsar os camponeses, apresentou a seguinte proposta: 1) Expulsar mais de 2 mil famílias e concentrá-las num projeto habitacional cercado por pistoleiros (favela rural).
A Dra. Maria José Amaral, membro da ABRAPO, representando a Associação Camponesa de Barro Branco e a L, denunciou que a Usina Frei Caneca faliu e deixou mais de 350 milhões de dívidas com a União, o estado e os trabalhadores, figurando na lista dos 100 maiores devedores trabalhistas do Estado de Pernambuco. Assim, a Advogada dos camponeses questionou a própria legitimidade dos contratos de arrendamento firmados entre a Usina e a Agropecuária Mata Sul, afirmando que a Usina não poderia estar arredando suas terras, e que se arrendasse, a renda obtida deveria estar sendo utilizada para quitar as dividas com os trabalhadores, ao contrário do que está sendo feito, que é utilizar desses contratos para entregar essas terras na mão do latifúndio agroexportador. Por fim, defendeu que a dívida da Usina fosse convertida em terras para os camponeses. O Promotor Agrário, Leonardo Caribé, simplesmente afirmou: “Não estamos aqui para garantir a lei. Estamos aqui pra fazer acordos”.
Neste ambiente hostil aos interesses do povo, advogados da T e da FETAPE também criticaram que estávamos falando de pessoas e não de gado. Que as pessoas tenham casa, produção e uma vida nestes lugares, não podem ser movidos como animais ao gosto dos interesses económicos destas empresas. Que nenhuma movimentação deveria ser permitida antes de uma vistoria técnica pelos órgãos competentes, INCRA e ITERPE, para determinar as posses, as áreas para desapropriação e as áreas para preservação da natureza.
O diretor-presidente do Instituto de Terras e Reforma Agrária de Pernambuco (ITERPE), Henrique Queiroz, interviu de forma infeliz. Alegou que “haviam camponeses ricos” e estes não deveriam ter direito à terra. Por “camponeses ricos”, leia-se famílias camponesas que vivem nas terras há mais de 100 anos e atualmente possuem grande produção de banana prata e até cana de açúcar que abastecem os CEASAS e até mesmo outras usinas ainda ativas na região. Sem a produção agrícola destes camponeses a Zona da Mata pernambucana sofreria um colapso de produção. Mas, ao que parece o ITERPE só reconhece como camponês aqueles que vivem esmolando na porta dos governos e os pequenos produtores rurais são desprezados do direito a terra.
O vice-superintendente do INCRA de Pernambuco, Joilson Barreto Costa, declarou que o órgão atualmente tem interesse, dinheiro, técnicos e carros para realizar a vistoria de todas as terras do município de Jaqueira-PE para os camponeses. Diferente do que havia alegado no dia 26 de outubro, na Grande Audiência Camponesa, que não havia dinheiro para fazer nenhuma vistoria e nenhuma desapropriação, agora declarou que “os conflitos do município de Jaqueira-PE são prioridade nacional”. Contudo, não pode fazer vistoria em terras invadidas nem em áreas que a empresa não permita. Então, Promotor Agrário encaminhou solicitação para Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para notificar a empresa latifundiária que todas as terras serão vistoriadas. Contudo, questionado sobre prazos para inicio e conclusão destas vistorias, o INCRA não soube responder.
Ao final, as propostas da empresa latifundiária foram frustadas pelos camponeses e suas representações, principalmente pela L. Mesmo com as promessas vazias do INCRA e do ITERPE, foi reafirmado a continuidade dos trabalhos de auto-demarcação das posses antigas e a luta por conquistar todas as terras para os camponeses da zona da mata de Pernambuco, independente das ameaças da pistolagem e das promessas do velho Estado, os camponeses reafirmaram seu compromisso expresso em sua histórica palavra de ordem: Conquistar a terra e destruir o latifúndio!